ADULTÉRIO NO MUNDO JURÍDICO

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Na semana passada os tabloides do mundo jurídico noticiaram dois casos de adultério envolvendo a classe de juízes e advogados.

 

O primeiro caso noticiado, ocorrido entre um casal formado por um juiz e uma juíza, foi objeto de representação no CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Ela, queixando-se pela infidelidade do marido resolveu pedir a interferência estatal. Tentou mostrar que o Estado também havia sido traído uma vez que um dos encontros da relação extraconjugal teria ocorrido em horário de expediente. (É normal o ser humano chamar o outro para odiar junto, mas longe de ser algo bom.) No caso, o CNJ arquivou a representação sob o fundamento de que a produção estatística dele, mesmo com suas escapadelas, era maior que a dela e por isso não se sentiu traído por ele.

 

No segundo caso (advogada e advogados) ocorrido em escritório importante do Brasil, ao que se sabe, não houve judicialização do efeito danoso. Foi pior. O caso foi levado ao tribunal mais injusto, despreparado, contraditório e cruel: a mídia.

 

O que aconteceu, nestes episódios, a meu ver, não é nada diferente do que acontece, há muito tempo, na humanidade.

 

Para o Direito atual brasileiro, a fidelidade é uma obrigação do casamento (art. 1.566, I, Código Civil). Já na união estável, o legislador, tentando ser mais “moderno” suprimiu a expressa menção a esta obrigação. Por sua vez, no campo do Direito Penal, o adultério não é mais considerado crime no Brasil desde 2005.

 

Porém, além do direito que rege estas relações, muito mais relevante que ele, há o contrato invisível, mudo e sentimental existente em todas as relações amorosas.

 

As pessoas se escolhem e começam, por vontade própria, a se relacionar afetuosa e sexualmente (não necessariamente com os dois aspectos sempre unidos, embora seja bem conveniente que isto fique claro e expresso entre os dois), e com o tempo, vão moldando este contrato, de forma orgânica . As cláusulas são revistas frequentemente. Entre estas cláusulas há uma bem comum: a fidelidade. O Direito materializa expressamente esta cláusula nas relações de casamento. Nas uniões estáveis, não.

 

Embora ela tenha sido vilipendiada, especialmente pelos homens, no passado, em razão da resiliência feminina, hoje, a cláusula da fidelidade merece especial atenção.

 

A mulher, sendo reconhecida como igual ao homem (art. 5º, I, Constituição Federal) – não por ter se tornado, pois já o era, como bem relata Platão na obra A República – galgou com o tempo uma libertação financeira e, junto dela, a libertação sexual.

 

As angústias de Madame Bovary foram ouvidas pela humanidade. Flaubert, seu autor, do sexo masculino, talvez tenha sido o precursor do movimento feminista no mundo. Foi ele que teve coragem de colocar no papel as dores que ele via nas mulheres da época. E foi julgado por isso.

 

Assim, hoje o que vale para um, vale para o outro também. Dizer que homem tem mais desejo sexual que a mulher e, por isso, teria uma carta branca para a infidelidade, tornou-se um argumento jurássico. Mesmo porque, em muitos casos ele não é nada verdadeiro. Há mulheres que possuem mais desejo. Simples assim.

 

Neste ambiente de igualdade, o assunto merece ainda mais atenção, pois coloca em risco a base da sociedade: a família (cf. art. 226, Constituição Federal).

 

Antigamente, a família estava protegida. O homem fazia o que queria e a mulher cuidava da família. Nada que o homem fizesse era motivo para o divórcio. A mulher sem acesso a dinheiro, estudo ou trabalho, não tinha opção a não ser aguentar. Muitas famílias foram mantidas desta forma.

 

Hoje as coisas mudaram. E estes dois casos ocorridos na mesma semana, são mais uma prova disto.

 

Evidente que, desde o Brasil Império vários juízes tiveram relações extraconjugais no horário do expediente. Advogados também tiveram relações extraconjugais com mulheres em seus escritórios. Todos sabem de pelo menos um caso assim.

 

A novidade, de um tempo para cá, é que se noticia a existência de juízas e advogadas que tem poder, dinheiro e atitude.

 

A outra novidade são os celulares. Todo mundo hoje carrega uma câmera (potente e com zoom) no bolso. Por isso, o que agora os olhos veem, a câmera pode registrar, e, em segundos a imagem pode estar na tela de milhares de pessoas, que sentem. Todos sabem de pelo menos um caso em que “fulano” ou “beltrano” descobriram um ou outro em uma relação de adultério devido informações obtidas nos celulares.

 

Assim, se a pessoa não for um agente da CIA ou da KGB, especializado em todos os cuidados de espião/espiã internacional, precisa saber que uma hora ou outra será descoberta. E o que estará em jogo será a base da sociedade: a família.

 

A família se sustenta em quatro amores: Eros, Philia, Storgè e Ágape. Eros é o amor romântico, sexual. Philia, a amizade. Storgè o amor à própria família. E Ágape é o amor ao Sagrado, a Deus.

 

A infidelidade é fruto, normalmente, de Eros. Mas dando atenção a ele, o ser humano pode frustrar os outros três amores da família. É arriscado.

 

Antigamente, a infidelidade não colocava em risco a família. Hoje coloca! Por isso merece melhor atenção.

 

Nos dois casos, à margem dos picantes detalhes dos casos concretos, não podemos deixar de nos manifestar e sensibilizar pela tristeza das famílias que estão protagonizando esta dor.

 

Nos dois casos mencionados de adultério, envolvendo a família de juízes e advogados, há crianças que fazem parte delas. Crianças que possuem celulares e acesso às informações sobre as novelas protagonizadas por seus pais, as quais já se encontram no Google. Nas duas famílias mencionadas, por certo, há vários membros que estão sofrendo com a situação.

 

Enfim, Eros dá prazer e é bom, sem dúvida. O desejo de violação à regra também tem suas atrações pelo lado não virtuoso humano.

 

Mas, criança é bem Sagrado! E elas precisam ser protegidas, conforme bem determina nossa Carta Magna, em seu artigo 227.

 

Não adianta dar bom estudo, saúde, viagens, bons presentes, e não dar o que elas mais querem e precisam: um lar harmônico, no qual possam se desenvolver de forma sadia e digna, nos termos do que prevê o artigo 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990).

 

Fácil? Ninguém disse que é. Em todas as tradições religiosas os sacerdotes, rabinos, padres e pastores já avisam os nubentes de antemão.

 

Lógico que ninguém deve ser infeliz pela felicidade da família. Mas também, se cada um buscar somente a sua própria felicidade não há família que sobreviva. Não haverá filho cuidando de pai idoso. Não haverá cônjuge cuidando do outro quando estiver doente. Soube de um pai que tinha 13 filhos. Ficou no hospital por 90 dias internado. Quem ficou com ele os 90 dias, sem descanso, foi a esposa, pois cada filho ou filha tinha a sua esposa ou marido e filhos para cuidar.

 

Evidente que o divórcio foi uma conquista. E é um ótimo ingrediente à família. Ninguém é mais obrigado a ficar com ninguém. Ninguém é mais obrigado a permanecer em relações abusivas. Por isso, cada um deve cuidar da felicidade do outro para que continuem querendo estar juntos e façam a família toda feliz.  E, se em um determinado momento a situação for realmente insustentável, que se separem, mas que continuem sendo bons pais e boas mães para seus filhos construindo uma relação, no mínimo, respeitosa.

 

No escritório tive um caso bem complicado, com muitos processos e muita briga. Depois de um tempo, os nervos já acalmados, um dos três filhos do casal estava com um problema na escola. Foi um motivo para os pais conversarem com civilidade, e ao final da conversa por telefone, a mãe manda um beijo para o ex-marido. A filha, de lágrimas nos olhos, após ser testemunha sentimental de anos de litígio, pergunta aliviada: “Mãe, você mandou um beijo para o papai?!”.

 

Dito isso, importante saber que o divórcio termina o casamento (Eros), mas não põe fim necessariamente à amizade (Philia) nem muito menos à família (Storgè) e menos ainda, a Ágape que representa o nosso amor e responsabilidade pela própria humanidade.

 

[1] Advogado, sócio do escritório Korte e Korte Sociedade de Advogados.

Last modified: 11/11/2019

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